Trote 21

O galope mecânico de um eléctrico

Que te entra pela boca

áspero e incendiário

urgente na contemporaneidade

de um botão de punho.

 

A máscara ladrihada do teu cabelo

A tusa das araras de fibra

Tão importante o teu cabelo

Neste mundo – os teus cabelos

Marxistas míopes.

 

Fundo-me com as marquises de Odivelas

A um golpe pélvico da prostação doméstica

Preso por um gancho pendulo

entre a combustão efémera da pólvora

e a notoriedade do papel de parede bege.  

Gaia

vês

os feixes de luz a ziguezaguear

na plácida água que cai em toadas

sobre os telhados dos casebres sós

a humanidade perdida segue-te nas sombras

por entre as ervas altas que crescem nos corpos espectrais

cerras os olhos

e imaginas a Terra marmórea

mulher de feixes e circuitos e voragens e cicios

de pés de aço e mãos que são como armas

de olhos sem pupila nem humor vítreo

vermelhos e ocos

sem boca nem esófago

plasmando em catadupas memórias alheias

guerra, amor, raiva, tristeza, alegria

viagens no tempo supersónicas, maquinais, mudas,

expectantes do delírio do eterno vácuo

a noite cintilante de supernovas e anãs

explosões cósmicas acutilantes

botas de couro e estilhaços de vidro

fogo posto e ódio em labaredas vagueando

no espaço

plúmbeo e estéril das câmaras ardentes

auscultas por entre as nuvens de cinza e pó radioativo

a revelação

com o sangue borbulhando na garganta

uma pitonisa

repete no silêncio da sua caverna sideral

antes do grande mártir

antes do fosso do mar vermelho

antes das cheias e vulcões cuspindo lava

antes das pragas de insetos e dos homens-escravos

tudo isto aconteceu antes

e acontecerá de novo

uma torre

je veux écrire
tu ne sais pas
tu ne sais même pas
quoi qui je suis
méteque et sentimentale
não pedirei desculpa
pelas madrugadas que habito
insone superficial hirta do torpor de sonhos-nada
niente cosa fare
we are doomed you know
to the falling of the mask failing to fall
e dopo
è finita la storia