disse que era um bocado assim
menos nem tanto
o que pouco importa
era o muito que sentia
as palavras galgando o coração
e ao contrário
disse que era um bocado assim
menos nem tanto
o que pouco importa
era o muito que sentia
as palavras galgando o coração
e ao contrário
Era um país de gente metida
que calava a fome e o frio
metidos até à medula
gente que se benzia e torcia
da roca fios com que se cobrir
era um país de meninos rugosos
chupando cigarros
um país de meninas tristes
que pediam licença para sair a brincar
porque nesse país seriíssimo
brincava-se até sair nova Lei
e depois acabava-se a brincadeira
era um país que ria pouco
e chorava muito
E certo dia, sem que ninguém disso desse conta
(e todos nesse país prestavam contas)
deu-lhe uma apoplexia
e do país sobrou
uma respiração rouca e o sangue viscoso
mal deu tempo de vestir preto
e contar esta história
Repara bem, Teotónio,
no que as pessoas em volta apresentam
raras vezes é de facto uma apresentação
dirás delas o que delas desconhecem
em ruptura automática com o desejo e a pulsão
e tudo o mais que a sociedade constrói
Repara bem, Teotónio,
que também isto é falso
é um gesto falso, mais do que uma voz
entre tantas mais
é um gesto mentiroso
uma mise-en-scène de minhas mãos
Tão frias, repara bem, Teotónio
Tão frias estas mãos